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segunda-feira, 29 de julho de 2013

A VALIDADE DO CONHECIMENTO TEOLÓGICO

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Prof. Leonardo Miranda
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Não foi nem uma ou duas vezes que, em conversas informais com amigos e conhecidos, fui interpelado sobre a Teologia, especificamente sobre a validade do conhecimento teológico! Muitos já me perguntaram: “O que é teologia?” e “Para que serve teologia?” ou ainda “O que fazer com o conhecimento teológico”?

Evidentemente que no início, quando esta pergunta era feita inclusive por cristãos leigos eu me surpreendia e até me chateava, contudo, com o tempo percebi que a Igreja latina é laica, sendo produto de uma miscelânea de interpretações teológicas e estratégias missionárias e, portanto, não privilegiar a teologia ou mesmo não se preocupar muito com os fundamentos da fé cristã de modo sistematizado é mesmo uma característica nossa. Mas não para a nossa alegria!

A questão é que o latino, especificamente o brasileiro, não vê a educação em geral, incluindo a cristã, como um fim em si e um patrimônio a ser alcançado. Ao contrário, a ideologia do consumo transforma nossa cultura fazendo com que só vejamos como patrimônio bens materiais. O resultado disso é que a educação e as áreas de conhecimento das ciências humanas, incluindo a teologia, ficam relegadas ao segundo plano, algo de menor importância, justamente porque as pessoas pensam logo em como se beneficiarão de modo pragmático de qualquer informação que obtiverem. Prova disso é que geralmente os salários pagos no primeiro e segundo setor da economia em que as profissões são em sua maioria oriundas das áreas das ciências biológicas e exatas são mais altos do que os do terceiro em que prevalecem as profissões das áreas de ciências humanas.   

Então, diante das várias experiências de ser questionado, resolvi dar minha contribuição sobre a validade do conhecimento teológico. Vamos refletir juntos:

Assim como o conhecimento científico é o resultado da pesquisa científica que faz uso de um método científico qualquer, o conhecimento teológico é o resultado da pesquisa teológica que faz uso de métodos teológicos específicos.

E como o conhecimento teológico visa alcançar uma das faces da verdade, para a Teologia, essa face pode ser encontrada pelo caminho da investigação com base em dois fundamentos:

  • A fé: Deus falou aos homens por meio de intermediários que transmitiram sua mensagem. Então, pode-se afirmar que a teologia é uma reflexão racional e sistemática que parte dos dados da fé e, por isso, pressupõe a fé.

  • A Revelação de Deus: Essa Revelação tem um fundamento histórico. O cristianismo parte, por exemplo, da existência histórica de Moisés, do povo de Israel, de Jesus Cristo, dos Apóstolos.

Na interação entre fé e Revelação ocorre a investigação da realidade e a busca pela verdade com uma concordância intelectual acerca da existência de Deus e sua intervenção na história. Assim, para o teólogo, a afirmação de que Jesus Cristo morreu na cruz para a salvação dos homens contém um dado histórico e um dado de fé. Historicamente, existem as provas para afirmar que Jesus morreu crucificado, na província romana da Palestina, no ano 30 da era atual, mas só a fé nele é que se pode afirmar que essa morte é o ato de salvação dos homens.

O teólogo procura “entender” a fé, encontrar motivos para a sua crença, pois não renuncia o uso da “razão”. Irá, então, sistematizar seus dados de fé e procurar integrá-los em toda a sua experiência humana. Por exemplo, poderá perceber que a mensagem de fé a respeito da “vida eterna”, da “ressurreição final”, é uma resposta ao presente anseio de felicidade existente no homem; ou que todo o estilo de vida de Jesus é uma boa premissa para acreditar nele.

Assim sendo, o conhecimento teológico tem um aspecto “científico”, no sentido de que é racional, metódico e sistemático. Pense, por exemplo, na sistematização das disciplinas teológicas: dogmática, moral, ciência bíblica, histórica, eclesiástica, mas tudo isso sempre a partir do ato de fé e das informações contidas na Revelação. Então, objetos do conhecimento teológico são os dados da fé, manifestados historicamente na Revelação.

Essa é a razão de ser do conhecimento teológico que, a partir da fé, reflita sobre Deus, sobre o ser humano, sobre o restante da realidade e como acontece a inter-relação de todos estes personagens e elementos. Para isto, os métodos teológicos devem ser usados na procura da integração entre a fé e a razão.

Repare que na teologia os valores estão baseados no ensinamento do Reino de Deus cujo patrimônio maior não é um bem material, mas sim assumirmos uma visão cristã de mundo que nos possibilite representar, enquanto Igreja, os interesses de Deus e seu Reino. Portanto, o maior bem do qual podemos nos beneficiar é a regeneração em Cristo e a preparação para a eternidade com Deus. Como não há nada de pragmático ou mercantilista nisto, é por isso que a maioria, inclusive de cristãos leigos, não sabe o que fazer com o conhecimento teológico.

O que vale mais: um ser humano ou uma casa? Uma pessoa ou um carro? Uma criança recebendo educação e sendo preparada para a vida ou uma vaga de diretor de uma grande corporação multinacional? Estas perguntas chegam a ser simplórias e certamente, para alguns, até sem fundamento, mas observe que nos valores do Reino e ser humano sempre valerá mais e nos valores fora do Reino, os bens que podem ser adquiridos sempre valerão mais!

Pense nisto! Pense na real validade do conhecimento teológico!

segunda-feira, 22 de julho de 2013

TEOLOGIA LATINA: PARA QUE SERVE?

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Prof. Leonardo Miranda
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Os conceitos, as pesquisas, os métodos e as respostas usadas em Teologia são todos formulados e adequados de acordo com a compreensão que o teólogo tem sobre o que é Teologia. A própria Teologia Latino Americana não foge a esta regra. E é exatamente sobre esta compreensão que este artigo reflete, pondera, sem, contudo, absolutizar as definições aqui apresentadas.[1]

O fundamento da Teologia é a Revelação de Deus encontrada na sua Palavra. A função da Teologia é refletir sobre Deus e todo o restante da realidade à luz da fé e o ponto de partida teórico do discurso teológico é exatamente a fé que, por sua vez, é determinada pela “experiência da fé” com a graça de Deus. É desta que a teologia se nutre.

Através da Palavra de Deus, principio iluminador da teologia, é que ocorre o desejo de praticar teologia. E o resultado pode constituir um “ponto de confronto com a fé”, um referencial para verificar a autenticidade da própria fé, por assim dizer.

A linguagem teológica, especificamente a latina, valoriza a linguagem simples procurando um meio-termo entre a linguagem unívoca, literal, de uma só interpretação, um só sentido e a linguagem equívoca, que pode ter mais de uma interpretação, mais de um sentido. Esta é a linguagem da comparação: ao mesmo tempo em que diz algo de verdadeiro sobre Deus, qualquer teólogo, incluindo o latino, sabe que o diz de modo inadequado, incompleto, sem saber tudo, isso porque Deus é sempre maior. Enfim, o cristão latino americano sabe que para falar sobre Deus e a relação com o ser humano e o restante da realidade, deve falar de modo que seu discurso, seu trabalho teológico, seja acessível ao povo em geral.

A teologia é caracterizada como ciência na medida em que realiza as condições requeridas para tal, isto é, de ser crítica, sistemática e auto-amplificativa. Isto significa que mesmo que a teoria teológica contribua para a articulação da metodologia e da própria pesquisa teológica nos ambientes acadêmicos, o mais importante na produção teológica será o resultado do confronto entre fé e prática na vida real. Por isso o teólogo precisa tomar parte ativa na vida concreta da comunidade, de modo especial através do seu compromisso com Deus e com o mundo. Somente assim sua teologia conseguirá realmente ser rica, fecunda, verdadeira e realista.

A Teologia é altamente relevante por considerar a existência de Deus e que toda absolutez só se encontra nele. Deus é o “objeto máximo do pensar humano” e a busca derradeira da humanidade. Todas as outras ciências são consideradas como instrumentos ou mediações importantes para a teologia, no sentido de ajudá-la na compreensão da realidade. Além disso, as áreas do saber trazem à teologia uma válida contribuição crítica. Da filosofia, por exemplo, a teologia não incorpora necessariamente um sistema, mas sim um espírito ou postura filosófica diante da realidade. Já as ciências constituem hoje um interlocutor privilegiado (embora não exclusivo) da teologia, pois lhe fornecem as mediações culturais, particularmente através das ciências sociais que, para o contexto latino, são fundamentais na interpretação de nossa multiculturalidade.

Por fim, ainda tratando das articulações da teologia, cabe uma palavra sobre o pluralismo teológico característico na América Latina. A diversidade de teologias, de respostas, encontra sua justificativa em dois fatores importantes. O primeiro diz respeito à transcendência da fé: teologia alguma, por ser humana, consegue dar totalmente conta de responder tudo; ao contrário, só Deus é pleno, é total, é absoluto. O teólogo deve sempre se manter numa posição de humildade, lembrando constantemente do “Mistério sempre maior”, e, portanto, transcendente a toda linguagem humana. O segundo fator é a limitação do contexto cultural, que também é foco de estudo de toda teologia, ao ponto de condicioná-la.

As respostas dos teólogos latinos devem ser dadas a todo aquele que indaga acerca da realidade, mas principalmente à comunidade eclesial, à Igreja, pois o objeto da teologia, que é a fé revelada, é uma realidade confiada a todo o povo de Deus.

Então, as disposições básicas para o estudo da teologia enquanto reflexão da fé a serviço do ser humano exige as seguintes disposições: 1) amor ao estudo da fé vivido numa vitalidade sempre nova, 2) senso do mistério e a consequente humildade intelectual e teológica e 3) o compromisso com o ser humano.

Se todo saber humano deve estar à serviço da vida, a prática teológica latino americana na vida cotidiana não termina e nem pode terminar no puro saber, mas no compromisso da fé com o amor a Deus e ao próximo.

Pense nisto!

[1] Este artigo foi produzido a partir da leitura e adequação de uma resenha escrita por Rodrigo Assis Rosa, do livro de Clodovis Boff, Teoria do método científico. A resenha foi encontrada no site <http://www.lanteri.org.br/htm/teoriameto.htm>. Acesso em set. 2010.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

TEOLOGIA LATINO AMERICANA: VALORIZANDO A PRATA DA CASA

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Prof. Leonardo Miranda
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“Teologia Latino Americana”, esta é, com certeza, uma nomenclatura nova! Era algo inexistente a bem poucas décadas atrás. Formada essencialmente pela Teologia da Libertação e pela Teologia da Missão Integral se mostra diferenciada das teologias clássicas exatamente por ser muito parecida com o próprio latino-americano. O latino possui um estilo de vida que demanda flexibilidade e adaptação se ele quiser sobreviver. Assim é sua teologia.

Vivemos um momento incrivelmente transformador e peculiar. No Brasil na política já temos a primeira mulher a ser presidente da República, na economia sobrevivemos a uma crise em nível mundial, na religião assistimos dia a dia a proclamação do diálogo inter-religioso, no esporte o Brasil sediará a Copa do Mundo e nas demais questões sociais a principal é a tentativa de independência moral da homossexualidade. No que se referem aos demais países temos um Haiti ainda em ruínas, uma Cuba que se abre ao capitalismo, uma Venezuela com ditadura em pleno século XXI, uma Argentina com Economia recessiva, etc.

Como se já não bastasse o cristianismo na América Latina a cada dia toma novas formas: algumas bíblicas, algumas heréticas. E de vermos todo este dinamismo lançamos uma pergunta: como se relacionar com Deus e servi-lo numa América Latina tão fluida em seus conceitos e em sua adaptabilidade para sobreviver na globalização e ao mesmo tempo tão mais sólida pela maturidade adquirida de todos estes anos de opressão?

Desse contexto fala-se na Teologia Latino Americana como um produto reflexivo, extraído não apenas do conteúdo bíblico, mas das próprias demandas da vida latina. Se Filosofia e História caminham lado a lado com a Teologia na tentativa de elaborar respostas, em se tratando da teologia latina, a presença e participação destes três pilares parece se acentuar ainda mais com o apoio também das leituras políticas e econômicas. Na América Latina, nenhuma teologia sobrevive se não contar com estas leituras.

E se considerarmos que seu nascimento ocorre no século XX e que já causa impacto em nível internacional certamente é algo que veio para ficar. Não conseguiremos mais nos livrar dela. Graças a Deus por isso! Mas quais as suas características?

Possui identidade plural

Assim como o continente que lhe dá o nome possui uma identidade plural, este sistema teológico também. Observe: ao olharmos para a história da América Latina com a presença dos nativos, dos vários colonizadores, dos escravos estrangeiros e de outros povos que tiveram curtas passagens por aqui nos tempos dos “descobrimentos” e observarmos todas as heranças culturais aqui deixadas, certo é que afirmaremos sem exitar que não podemos falar em uma cultura, um costume, até mesmo uma América Latina. Talvez a descrição que melhor se encaixe seja “Américas Latinas” dentro da enorme junção dos continentes Central e Sul. E assim é com a Teologia Latino Americana.

A própria pluralidade dentro do cristianismo latino - protestantes históricos, pentecostais históricos, neopentecostais, igrejas emergentes, métodos e mais métodos de evangelização e as mais variadas propostas teológicas, algumas amplamente conhecidas e outras localmente conhecidas - faz com que, por obrigatoriedade, a Teologia Latino Americana seja plural.

Obviamente que ainda não é possível falar em um sistema pronto, definido, portador, inclusive, de um compêndio de teologia sistemática latina, justamente por sua pluralidade e por ser ainda tão nova. E para muitos teólogos latinos é até melhor que seja assim mesmo, mais livre, menos engessado. Contudo, o grande diferencial desta teologia é que ela está muito mais focada nas demandas políticas, sociais, econômicas, educacionais e todas as demais instâncias da vida humana no nosso contexto. 

E para que possa se focar neste diferencial tenta, aos poucos, amadurecer em termos de crenças, de conceitos e práticas. Note: por costume, ainda usamos as teologias sistemáticas importadas da Europa e dos Estados Unidos. Nossa cultura evangelical, mesmo multifacetada, carrega em grande parte a essência de valores e comportamentos dos ensinos das missões norte americanas e algum resquício das missões européias. Estes primeiros ensinamentos em si não são ruins; ao contrário, são importantes para nos reconhecermos, sabermos quem somos e qual o meio que Deus utilizou para que o Evangelho chegasse a nós. Contudo, é hora de amadurecer e criarmos a nossa própria teologia, a que tem mais a ver conosco, a que nos identifica como cristãos e ao mesmo tempo como latinos, que não tira de nós a nossa humanidade, a que revela a flexibilidade do Evangelho no alcance das culturas, incluindo a nossa. 

Almejarmos por termos a nossa própria teologia não significa que jogamos fora todo o arcabouço teológico dos primeiros ensinamentos, mas, sim, que reconhecemos que eles já não dão mais conta de responder aos nossos anseios. Imagine uma pessoa que na primeira infância vive sob a tutela dos pais e se dá por satisfeita com as singelas respostas, mas o tempo passa e chega a adolescência e a juventude e esta pessoa sente, naturalmente, pelo próprio processo de maturidade, a necessidade de viver sua própria vida. Assim se manifestou entre os cristãos latinos: precisamos e queremos viver a nossa própria teologia!

E nesta busca por uma identidade, ou várias identidades ou uma identidade plural, a Teologia Latino Americana busca ser contextualizada, voltada para o ambiente sócio-histórico e cultural específico. Como reflexão pensada a partir da fé, focada numa determinada realidade da vida latina, a Teologia Latino Americana é também universal no sentido de que, ao pensar a fé e a prática, pensa em como ordenar a vida já neste mundo, sem, contudo, descartar o porvir, mas enfatizando o aqui e agora. Tanto é que seu método investigativo não é a especulação filosófica e nem a especulação apocalíptica. Pelo contrário, é o método hermenêutico, pois se preocupa em como interpretar esta realidade no que tange a qual a melhor forma de se viver o Evangelho e anunciar o Reino envolvendo-se em todas as instâncias da vida latina[1].

Está em construção

Eis o grande desafio! Como já se sabe a Teologia Latino Americana não passa de uma jovem forma de crer e pensar, entretanto não denigre os princípios bíblicos e nem as tradições cristãs, mas reivindica que a América Latina seja vista com respeito e consideração. Que seus cristãos sejam também vistos como herdeiros de uma liberdade de viver e pensar a palavra de Deus conforme sua própria cultura, daí a luta para tentar se construir.

Se por um lado a igreja latina padece por não possuir seu próprio compêndio de teologia sistemática, por outro lado se beneficia da pluralidade teológica interna que possui e convida a todos os ministros e leigos, teólogos ou não, que estejam dispostos a pensar a vida cristã latina de modo coerente com a liberdade dada por Deus para a criação, re-criação e vivência da própria cultura.

O que não falta é terreno, oportunidade. A América Latina pode ser considerada um bojo efervescente de beleza incomparável, mas ao mesmo tempo com problemas político-econômico-sociais que afetam todas as demais áreas e problemas religiosos que também não ficam atrás.

Talvez nunca seja possível a junção de todas as reflexões teológicas elaboradas na tentativa de responder a “ausência” de Deus nos milhares de lares latinos, todavia é certo que há espaço para todos os que desejam contribuir na construção do pluralismo teológico respaldado pelo conteúdo biblicamente coerente.

Pense nisto!


[1] Sanches. A Teologia Latino-Americana. Disponível em <http://www.teologiaemissao.com.br/sobre_a_tla_2.html>. Acesso em jan.2012.